Educação Cristã e Transformação Social
Cada vez mais a educação é vista como um ingrediente-chave para a transformação social. Pais, políticos e professores acreditam no potencial da escola para fazer a diferença na vida de milhares de crianças e adolescentes. Até mesmo para os próprios alunos, a educação é vista como a segunda maior fonte de esperança para uma vida melhor, perdendo apenas para o desenvolvimento tecnológico. [1]
Contudo, por trás desse otimismo, há uma certa ingenuidade que frequentemente passa despercebida. A expressão “transformação social” está associada a mudanças na forma como a sociedade se organiza e as pessoas vivem suas vidas no cotidiano, mas o termo “transformação” em si é neutro.Transformar ou mudar significa introduzir uma alteração ou modificação na forma, aparência, estado ou condição, sem dizer se isso é algo positivo ou negativo. Além disso, o que para uns é considerado bom, para outros é ruim, pois pessoas diferentes têm visões distintas do que exatamente significa “um mundo melhor”. E mesmo quando há alguma concordância quanto ao destino, é bem provável que haja discordância sobre qual é o melhor caminho para se chegar lá. Por exemplo, uma visão mais conservadora provavelmente vai buscar preservar o status quo, já uma visão mais progressista provavelmente vai buscar concretizar algum tipo de florescimento ou utopia secular. E qual seria a visão cristã?
A visão cristã, no entanto, não é nem conservadora, nem progressista, pois está fundamentada nos propósitos criacionais e redentores de Deus. Do ponto de vista criacional, o mundo é bom, mas não é estático. O ser humano foi criado à imagem de Deus para gerenciar a criação no Seu lugar. E gerenciar não é apenas “cuidar”, mantendo o jardim do Éden exatamente como recebemos de Deus, mas também “cultivar”, desenvolvendo o potencial latente da criação, transformando-a com criatividade, sabedoria e responsabilidade (Gn 2:15).
O resultado de nos engajarmos neste processo de desenvolvimento é o que a Bíblia muitas vezes chama de shalom, um estado de prosperidade, florescimento e harmonia nas relações entre o ser humano e Deus, o seu próximo e o restante da criação. A educação faz parte desse desenvolvimento, pois é uma das formas em que podemos cooperar com Deus com o Seu propósito de maximizar o shalom na experiência humana.
Infelizmente, o ser humano se rebelou contra Deus e o Seu projeto, passou a viver no pecado e carece da intervenção de Deus. O pecado, porém, não é apenas uma coisa espiritual ou pessoal, pois ele traz distorções para todas as áreas da vida humana: a forma como tratamos as pessoas, como trabalhamos, como lidamos com o dinheiro, como nos organizamos socialmente, como usamos nosso conhecimento, etc. Até mesmo os nossos melhores esforços educacionais são falhos e incapazes de trazerem aquela restauração plena pela qual tanto ansiamos.
Felizmente, Cristo está trabalhando para redimir tanto as nossas vidas quanto os nossos relacionamentos, os nossos trabalhos, nosso sistema econômico, nossa vida em sociedade e nossa vida acadêmica. Cristo também está resgatando os nossos esforços educacionais e usando a educação para trazer restauração. A redenção plena somente será consumada por ocasião da Sua Segunda Vinda, mas enquanto Ele não vem, nós como discípulos de Jesus, somos Sua presença fiel neste mundo caído, agindo como placas vivas que apontam para consumação futura do Reino de Deus.
Do ponto de vista prático, dentro de uma perspectiva cristã, é útil fazermos uma distinção entre “Transformação” (com T maiúsculo) e “transformação” (com t minúsculo). “Transformação” tem a ver com aquilo que só Deus pode fazer. Somente o Pai pode nos transportar das trevas para a luz, somente o Espírito Santo pode transformar um coração de pedra em um coração de carne, somente o Filho pode implementar o reino dos céus aqui na terra. A boa notícia é que nós podemos experimentar essa Transformação desde já a partir da nossa fé em Cristo. Ao sermos unidos com Cristo, somos levados a viver uma nova vida justamente porque nEle já participamos da nova criação e experimentamos a renovação do nosso coração.
Mas isso não significa que a “transformação” a um nível mais humano e terreno seja algo menor ou sem importância. Pensando em termos educacionais, quando ensinamos com excelência, estabelecemos relacionamentos saudáveis com nossos alunos, criamos um ambiente seguro e propício para a aprendizagem, alfabetizamos uma criança, adolescente ou adulto, ensinamos matemática e organização financeira, recuperamos a sua autoestima e assim damos a essa pessoa a chance de quebrar o ciclo da pobreza estamos alcançando uma grande vitória. Ao fazermos isso, estamos cumprindo com o nosso chamado de sermos a presença de Cristo no mundo, bem como estamos oferecendo aos nossos alunos um gostinho da Transformação maior que está Cristo.
Assim, quando uma educadora cristã pisa na sua sala de aula, ela está ciente dos problemas pessoais dos seus educandos, dos dilemas sociais que circundam a escola e dos desafios organizacionais da própria escola. Ela busca conhecer as necessidades específicas das individualidades e da coletividade que é uma escola. Ela se pergunta como as coisas seriam diferentes se Jesus fosse o diretor do colégio ou o professor da turma. Ela faz o que está ao seu alcance para “dar um empurrãozinho” na direção certa para que aquele ambiente escolar experimente um pouco do shalom de Deus. Talvez isso signifique organizar um mutirão de limpeza ou uma palestra sobre bullying e relações saudáveis, ou arrecadar fundos para fazer a reforma do banheiro, ou encontrar um psicólogo para atender alunos nas suas crises emocionais.
A transformação social, aquém da eternidade futura, é “um trabalho de formiguinha” em que tocamos a cada vida pessoalmente. Como educadores cristãos, nosso foco não está nos resultados, embora esses também sejam importantes. Antes, nosso papel é estarmos presentes e sermos fiéis, plantando sementes, regando plantinhas, colhendo frutos, etc. Sabemos que, no fundo, todo o crescimento e transformação vem de Deus, e que Ele multiplica nossos menores esforços para realizar os propósitos dEle. Por isso, mantemos nossa fidelidade a Ele, damos o melhor de nós, e oramos continuamente, na esperança de que Ele nos conceda a graça de ver “transformações” e “Transformações” acontecendo diante dos nossos olhos.
Raphael A. Haeuser
Coordenador do Didaquê
TeachBeyond Brasil
[1] Conforme a Varkey Foundation (https://www.varkeyfoundation.org), 80% dos jovens apostam na educação para terem um futuro melhor.
Este texto é uma publicação conjunta com o STG — Seminário Teológico de Gramado. Acesse também https://medium.com/nossochimabystg.
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