O Uso Pedagógico da Bíblia na Escola

Sim, o tema é polêmico e costuma trazer animosidade. Por um lado, há aqueles que querem tornar a Bíblia um livro obrigatório nas escolas e, por outro lado, há os que tentam bani-la das bibliotecas escolares. Nesse pequeno artigo, não andarei nem por um caminho e nem por outro, mas opto por apresentar motivos pelos quais a Bíblia pode e deve ser usada em sala de aula, até mesmo por professores ateus, muçulmanos ou de qualquer outra religião, sem ofender as suas crenças.

Na verdade, o primeiro ponto a tratar é sobre o preconceito que há com relação à Bíblia. De fato, a grande maioria dos que a criticam jamais a leram ou estudaram com afinco. Frente a isso, preciso lembrar que a Bíblia é o livro mais popular da história da humanidade. Nenhum outro livro foi tão debatido, estudado, criticado, tantas vezes proibido e, ao mesmo tempo, tantas vezes copiado, publicado e impresso quanto ela. Calcula-se algo perto de 2 bilhões de seus exemplares impressos espalhados pela Terra. A Bíblia é uma coleção de 66 livros, que na versão Católica conta com mais 8 livros históricos e poéticos. Esses livros são a sustentação da fé cristã, tanto para Católicos, quanto aos protestantes das mais variadas igrejas. Mórmons, Testemunhas de Jeová e outros grupos específicos também têm a Bíblia como seu livro Sagrado. A sua primeira parte, o Antigo Testamento, é o texto sagrado dos Judeus e ainda é lido nas sinagogas. Mas não é só para esses grupos que a Bíblia é sagrada. O espiritismo, por exemplo, também bebe de sua fonte. Para os muçulmanos ela também é um dos livros sagrados e até no altar da umbanda você encontra um de seus exemplares abertos.

Mas a Bíblia não é apenas fonte de verdades de fé. Ela é o maior documento histórico que resistiu ao tempo. Suas páginas revelam detalhes e histórias de um mundo antigo que não existe mais e os seus dados históricos vêm sendo comprovados cada vez mais, conforme as escavações arqueológicas avançam. O seu texto original guarda variações linguísticas que dizem respeito ao surgimento da maior parte das palavras que hoje usamos no ocidente. Ela é cheia de tipos de textos, entre eles narrativas, crônicas, cânticos, poemas, lamentações, parábolas, reflexões filosóficas, provérbios, entre outros.

Além disso, a Bíblia se constitui na maior fonte de inspiração para as constituições e a legislação da maior parte dos países. A sua ideia de “amar ao próximo como a si mesmo” e as suas reflexões sobre o valor e a dignidade humana formam a base para os Direitos Humanos.

Diante de tão grande legado e influência sobre a sociedade e a vida das pessoas, especialmente em um país com o Brasil no qual cerca de 90% da população professa ser cristã, a pergunta mais adequada seria: porque não usaríamos a Bíblia em sala de aula? Por qual motivo excluiríamos uma coleção tão rica de livros do nosso trabalho pedagógico? Realmente não há nenhum motivo que justifique essa exclusão, a não ser que haja um interesse ideológico por diminuir o seu valor social e cultural.

Excluir a Bíblia da escola seria um ataque à história, à filosofia e ao livre conhecimento. Nossos alunos têm o direito de conhecê-la, estudá-la e apropriar-se do saber que emana de um documento que levou milênios para ser edificado por homens e mulheres do passado.

A opção do aluno crer ou não nas verdades de fé que ela apresenta é uma questão da sua liberdade religiosa, não cabendo ao professor interferir nessa decisão.

Esse direito de aprendizado é garantido por lei no Brasil, pelo texto da BNCC (Base Nacional Curricular Comum), que confere à disciplina do Ensino Religioso a tarefa de trazer o “conhecimento religioso” para a sala de aula. Um dos seus eixos temáticos é o estudo de “textos religiosos escritos”, dentre os quais a Bíblia tem proeminência, uma vez que o estudo das tradições religiosas deve dar preferência àquelas que façam parte do contexto social dos educandos. Resta, portanto, aos educadores brasileiros, o desafio de conhecer o “livro dos livros” e buscar meios de integrar seu texto aos estudos em sala de aula, mas sem fazer proselitismo (como exige a LDB — Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional). O foco deve ser o conhecimento histórico, geográfico, linguístico e principalmente os princípios éticos e ecológicos que emanam desse livro. Em dias em que muitos vivem sem um sentido, buscando no consumo de bens e entorpecentes o saciar de um vazio existencial, a Bíblia pode oferecer muito mais do que conhecimento; ela pode oportunizar sabedoria (saber viver) às novas gerações.


Dionísio F. Hatzenberger

O autor é graduado em História, especialista em Filosofia, e Mestre em Educação. Também possuiu formação em Teologia, Ensino Religioso e Mediação de Conflitos. É redator do Referencial Curricular Gaúcho e membro da Associação de Professores de Ensino Religioso do Rio Grande do Sul.

Foto por  Aaron Burden acessado no Unsplash.

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