Da Sobrevivência ao Sucesso no Ensino Online

O ensino remoto adotado durante a COVID-19 está obrigando os professores a mudarem a sua forma de ensinar. Mas se engana quem pensa que todas essas mudanças só precisam acontecer por causa da pandemia. Muitas delas já deveriam ter acontecido de forma natural por estarmos no século XXI. O que deveria ter acontecido de forma gradual, com o devido treinamento e adaptação por parte da equipe docente, teve de ser feito às pressas.

Como consequência negativa dessa transição emergencial para o ensino remoto, podemos observar que (1) a comunidade escolar geralmente está mais preocupada com a sobrevivência do que o sucesso; (2) os padrões de desempenho e a expectativa da capacidade de aprendizagem dos alunos são frequentemente reduzidos; (3) certos conteúdos tendem a ser omitidos porque julgamos serem difíceis ou até mesmo impossíveis de serem trabalhados virtualmente; e (4)  aspectos relacionais, afetivos e éticos da aprendizagem são facilmente negligenciados.[1]

Os Fundamentos Teóricos

Para nos movermos da sobrevivência para o sucesso na educação através da tecnologia, precisamos evitar dois extremos: O primeiro é supor que nada ou pouco mudou. Embora a tendência natural seja ensinar da forma como fomos ensinados, não podemos simplesmente replicar o processo de ensino-aprendizagem presencial no ambiente virtual. Entretanto, sem o devido treinamento e sem ter tido a experiência de ter estudado online, isso é muito tentador. No passado era comum fazer os alunos copiarem o conteúdo do quadro. Uma prática justificável quatro décadas atrás quando a internet não existia, livros didáticos eram raros, fotocópias eram caras e o mimeógrafo era reservado para as provas gerais. Atualmente, com os recursos e a informação que temos, fazer alunos copiarem PDFs faz pouco ou nenhum sentido.

O segundo extremo é acreditar que por estarmos usando tecnologia, a aprendizagem será automaticamente melhor e mais adequada ao nosso tempo. Quando descobrimos uma tecnologia nova, é tentador querer usá-la para todas as coisas. Por si só, o fato de que estamos usando um dispositivo eletrônico, como um projetor, por exemplo, não quer dizer que a aprendizagem será melhor do que se escrevermos no quadro ou utilizarmos cartazes.

Conhecimento Tecnológico e Pedagógico do Conteúdo (TPACK)

Tradução da imagem disponível em www.tpack.org

Felizmente, existe um caminho melhor. De acordo com o modelo TPACK (Tecnological, Pedagogical and Content Knowledge) desenvolvido por Matthew J. Koehler e Punya Mishra, professores devem adicionar o conhecimento tecnológico (TK) ao conhecimento pedagógico (PK) e de conteúdo que já têm (CK).[2]

O conteúdo é o que ensinamos. Não se trata apenas da disciplina que lecionamos ou o conteúdo específico que precisamos cobrir. Trata-se também do conhecimento especializado que temos como professores no que diz respeito aos fatos e conceitos dessa disciplina, aos seus arcabouços teóricos, aos seus modelos e analogias, e aos seus métodos e procedimentos.

O conhecimento pedagógico é como ensinamos. Tem a ver com o planejamento curricular e os planos de aula diários, bem como a escolha e a implementação de estratégias e metodologias de ensino, como exposição seguida de exercícios, pesquisa seguida de apresentações e debates, leitura e análise, etc. Isso também inclui tudo o que fazemos para maximizar a aprendizagem, como dar atenção aos diferentes estilos de aprendizagem, e ao gerenciamento, regra e rotinas da turma. É esse conhecimento que nos permite criar experiências educacionais excelentes para os nossos alunos.

Quando um professor consegue misturar esses dois conhecimentos, ele tem conhecimento pedagógico do conteúdo (PCK), conectando o que precisa ser ensinado com a melhor forma de fazê-lo. O que até recentemente era visto como o cenário ideal, hoje é insuficiente, pois também precisamos ter conhecimento tecnológico.

O conhecimento tecnológico é o parceiro! Por si só, ele não determina o que será feito, mas no ensino remoto ele está presente em cada etapa. Esse conhecimento tem a ver com saber usar, escolher e integrar as ferramentas tecnológicas à sua aula e precisa ser adicionado ao conceito pedagógico e de conteúdo a fim de obtermos o conhecimento tecnológico e pedagógico do conteúdo (TPACK), essencial para o ensino-aprendizagem online.

Sugestões Práticas

  1. Lembre-se de que a tecnologia não tem um fim em si mesmo; seu objetivo é facilitar e criar novas oportunidades de aprendizagem. A preparação de uma boa aula sempre começa onde sempre deveria começar: com o conteúdo a ser assimilado ou construído e as estratégias pedagógicas adequadas para o seu aprendizado. Somente depois que isso estiver determinado é que podemos escolher as ferramentas tecnológicas apropriadas.
  2. Considere o seu próprio contexto de aprendizagem. Além dos próprios alunos, todos nossos esforços tecnológicos também precisam considerar os dispositivos e ferramentas tecnológicas que eles têm à disposição. Não podemos exigir o que eles não têm condições técnicas de nos oferecer. Além disso, aulas virtuais levam mais tempo e são por natureza mais cansativas do que aulas presenciais. Dê tempo para que os alunos consigam se organizar e assimilar as coisas, mas não se esqueça de atribuir datas e prazos de entrega claros.
  3. Conheça e saiba usar as ferramentas tecnológicas a sua disposição, a fim de saber o que pode ser usado e quando. Temos uma infinidade de aplicativos e sites que possibilitam a comunicação, trabalhos colaborativos, a formulação de pesquisas de opinião, formulação de formulários com correção automática, apresentação do aprendizado via áudio (podcasts) ou vídeo, jogos educativos e sites de conteúdo. Você não precisa aprender usar isso “da noite pro dia”, mas vá se familiarizando com essas ferramentas e implementando-as gradualmente nas suas aulas
  4. Converse com seus colegas e aprenda com eles. Não é hora de ser egoísta com o que você descobriu e tem dado certo para você, nem a hora de ser teimoso, deixando de reconhecer a sua própria necessidade. Trabalhar com colegas também tem a vantagem de ter com quem testar as ferramentas antes de usá-las com seus alunos.
Raphael A. Haeuser
Coordenador do Didaquê
TeachBeyond Brasil

[1] Baseado na palestra “Transformational K12 Online and Blended Teacher Development: Surviving to Succeeding” (Desenvolvimento de Professores Transformadores do Ensino Fundamental e Médio para o Contexto Remoto e Híbrido: da sobrevivência ao sucesso), ministrada pela Dra. Cheryl A. Bostrom.

[2] ver http://matt-koehler.com/tpack2/tpack-explained/. Acesso em 17/03/2021.

 

Para um Momento Como Este (COVID-19)

Em função do atual momento em que vivemos, com medos e incertezas em relação ao COVID-19, o TeachBeyond Brasil criou este espaço de leituras para encorajamento da fé e como ponto de esperança para sociedade.

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